31 de ago. de 2007

*DOMINGO À TARDE NA PRAÇA NOVA


Ao longo da Praça Nova passeavam com um andar compassado, n’uma demorada regulada, grupos de empregados; logistas; negociantes de vinhos e proprietários paravam ouvindo, com attenção de sensatez e assentimento insuspeito, algum que fallava e mostrava gestos commedidos, pautados, de quem expõe uma ideia ou quer convencer. Um outro banco era occupado por famílias do povo, operários, velhos comerciantes aposentados, na passividade; pelas raparigas de trabalho com os seus trajes aceiados, do domingo, de cores vistosas, e creadas de gente rica guardando as creanças que brincavam, saltavam na calçada e nos bancos. A maior parte dos estabelecimentos em torno estavam fechados. Os caixeiros das duas lojas de moda, à esquina da rua das Flores, à porta, em pé, aborreciam-se, tinham bocados de conversas, dirigiam chalaças a alguma rapariga transeunte, ou a qualquer moça de cosinha, que voltava da fonte, ajoujada, vermelha pelo pezo do caneco cheio. No Café Central entravam e sahiam de quando em quando artistas, caixeiros, negociantes novos, no gasto domingueiro da chávena de café e da genebra, ou extravagancia das partidas de bilhar. Uns poucos barqueiros, catraeiros e algarvios dos cahiques de pescaria, vinham caminhando devagar, em direcção à taberna da esquina da rua Nova, falando soturnamente com o cachimbo ao canto dos beiços e as mãos atraz das costas. Da Ladeira do Monte desciam dois marinheiros inglezes bêbedos aos zigs-zags estonteados, cantando com uma voz berrada, mostrando os punhos fechados em attitudes de dar murros, seguidos e cercados pela garotada, que às vezes dava fugidas curtas, inesperadas, e gritava em apupos de boccas escancaradas.
Em baixo, no novo caes, quasi em frente da Praça parava o carro americano, despejando a gente que vinha de Buarcos, da praia e do Bairro Novo. Na esplanada ao pé da rampa, alguns serranos das barcas da Foz do Dão estavam encostados a umas pipas vasias. Um zelador municipal, o Caras Altas, policiava passeiando vagarosamente no lagedo da casa do Tribunal, olhando para uma parte e outra com uma posição lorpa de cabeça. Algumas famílias que habitavam as casas da Praça, enfastiavam-se à janella, com os braços pousados no parapeito, ou com a cabeça pezando sobre uma das mãos. (…)
Para baixo via-se uma pequena porção do paredão novo, as partes altas do theatro Príncipe D. Carlos, o guindaste das Obras Públicas pintado de encarnado, a doka onde oscillavam diminutamente amarados os hiates do costeiro, as rascas de Peniche, os cahiques do Algarve, os bateis dos carregamentos do porto e os barcos de transporte do Mondego. Depois, mais além, alastrava-se a largura esverdeada do rio, às vezes cortada pelos botes; avistavam-se os navios de maior lote, ancorados na estacada, com a bandeira da respectiva nacionalidade içada no topo do mastro da popa; mais adiante as marinhas do sal, d’um tom negro, onde se distinguiam parte dos depósitos rectangulares da água do mar; as casas caiadas, espalhadas irregularmente, das povoações de Lavos, Carvalhaes e Regalheiras, rodeadas de pinhaes e de uma vegetação escura; as habitações acanhadas e os moinhos da Galla; alguns denegridos casebres de madeira da Cova e uma grande porção do areal do Cabedello. A uma grande distância avultavam as estaturas enormes, d’uma cor pesada e triste, dos montes que se alongavam para as bandas de Leiria, apresentando uma perspectiva esfumada, um pouco nevoenta, que se ia azulando n’uma graduação insensível para o alto, e na direcção da Vieira branquejava uma larga e comprida tira da costa do sul.

*Gaspar de Lemos, do romance inédito “A Filha do Senhor Silva”, transcrito do Almanach da Praia da Figueira para 1878-1879, 1º ano, p.168-170, rep. em "Ruas e Praças da Nossa Terra II", de Isabel Simões, in Revista Litorais, nº 4, Maio 2006.


28 de ago. de 2007

GASPAR SIMÕES EM "A BOLA"



*O Dr. João Gaspar Simões** ingressa no «Team» de «A BOLA»

O team de…A Bola vai alinhar mais um nome – um nome grande das letras portuguesas. Trata-se do dr. João Gaspar Simões – crítico, ensaísta, romancista – que iniciará, a partir do próximo número, a sua colaboração neste jornal.
A presença do ilustre escritor e crítico literário num jornal desportivo constitui, só por si, motivo de geral satisfação. O dr. Gaspar Simões, aliás, como todos os intelectuais contemporâneos, aqui e lá fora, interessa-se pela marcha dos acontecimentos desportivos e lê os jornais da especialidade (…)
No próximo número, o dr. Gaspar Simões iniciará a sua série de “Cartas a um jovem desportista que se interessa por cultura”.
Vale isto por dizer que o dr. Gaspar Simões, todas as quintas-feiras, se dirigirá aos desportistas portugueses para quem não são supérfluos os problemas do espírito, esclarecendo-os, orientando-os, no sentido de que a sua prelecção pelos acontecimentos desportivos seja valorizada por mais directo contacto com a cultura.

*Jornal A Bola, 20 de Março de 1950
**João Gaspar Simões, Figueira da Foz, 1903 - Lisboa, 1987

27 de ago. de 2007

LAVOS CONCELHO



* (…) O período em que Lavos foi cabeça de concelho, com câmara de 5 vereadores na reforma Cabralista, presidente da mesma, administrador, substitutos destes, escrivão ou escrivães, juiz ordinário (não estando provado por escrito, ao que sabemos, que tivesse sido alguma vez “de fora”…) etc. foi em grande parte preenchido pela forte depressão económica e política que depauperou o país durante cerca de 50 anos. As invasões francesas, a exploração inglesa, as guerras civis, a emancipação do Brasil, foram as causas diversas que deixaram a nação exangue – situação a que só a “Regeneração” deu alento e vida.
E como se não tivesse tudo isto a atrofiar qualquer impulso de progresso económico na região, o último decénio da existência de circunscrição concelhia de Lavos foi manchado pela prepotência de um administrador facínora: o Joaquim da Marinha, cuja tenebrosa memória não queremos aqui recordar.
A freguesia tinha, em 1758, 422 fogos com 1602 pessoas. Era termo de Montemor, da comarca de Coimbra, e, conforme informação paroquial coeva “… nas sisas é cabeça a Vila do Louriçal onde pertence”.
Nesta época ainda eram enviados barcos de 3 e 4 moios de sal das marinhas de Lavos para Soure.
Quando a Figueira ascendeu a vila em 1771, ano do nascimento de Fernandes Tomás passou para a sua comarca e concelho. Alguns anos ela própria foi elevada a concelho, voltando à comarca de Coimbra. Em 1836 a grande reforma concelhia de Passos Manuel, promovendo a descentralização e pondo cobro à desordem divisional que reinava neste sector da administração pública, extinguiu (…) 498 concelhos dos 828 existentes e criou 21 novos municípios. Lavos foi um dos eliminados e o Paião um dos que então nasceram.

* In, Cap. João Mano, Lavos, nove séculos de história, CEMAR e J.F. Lavos, 2000.
Lavos viria a integrar com o Paião, em 1842, um novo concelho. Em 1853 foi extinto, passando a pertencer à comarca e concelho da Figueira. Maurício Pinto faz menção a um Código Municipal ou Colecção de Posturas do Concelho de Lavos aprovado em 1844 e de que foi último relator Francisco de Almeida Ramalho

25 de ago. de 2007

OS BURROS QUE IAM A COIMBRA

Era uma vez um homem que alugava dois burros que tinha para irem a Coimbra levar e trazer estudantes.
E dizia ele:
- Ora vejam lá como são as coisas deste mundo! Todos os anos vai gente a Coimbra formar-se e todos os anos de lá vêem formados, só os meus dois burros vão lá quase todos os meses há uns poucos de anos e ainda não saíram doutores!

Do Folclore da Figueira da Foz, rec. Cardoso Martha e Augusto Pinto, 1913

24 de ago. de 2007

24 DE AGOSTO: FERNANDES TOMÁS E O SINÉDRIO



A 24 de Agosto de 1820 a guarnição militar do Porto dá início ao movimento que haveria de liquidar a monarquia absolutista. Por trás desta iniciativa estava o Sinédrio.

Criado em 1818, por impulso de Fernandes Tomás – que lhe escolheu o nome, o qual significa Assembleia e que reunia em todos os dias 22 na Foz do Porto, em casa de Ferreira Borges – o Sinédrio começou por ser composto por dez elementos: comerciantes, altos funcionários e militares.

Com a sublevação da Galiza e a proclamação da Constituição de Cádis o Sinédrio intensificou a sua actividade conspiratória, a ele se juntando altos comandos militares. O golpe foi preparado para o dia 29 de Junho mas gorou-se por ter recuado no seu apoio o Coronel António Teixeira de Barros. Entretanto, o ministro espanhol D. José Maria de Pando contacta Fernandes Tomás, prometendo apoio para a revolução em Portugal, mas tendo por condição uma União Ibérica. As crónicas falam de uma reunião à meia-noite, no jardim de Cedofeita, onde Fernandes Tomás, perante Ferreira Borges e Francisco Gomes terá dito: Perdermos a nossa nacionalidade! Nunca! Nunca!

Em Julho, Tomás parte para Lisboa em busca de apoios. Ao movimento adere D. Francisco de São Luís, patriarca de Lisboa, que leva para as suas hostes o Coronel Barros, de Braga. Quando Fernandes Tomás regressa ao Porto, o Sinédrio reúne e marca a data de 24 de Agosto para despoletar o movimento. Tomás reúne-se com o Brigadeiro Silveira Pinto – militar prestigiado no norte do país - para redigirem o manifesto, embora Tomás levasse o documento já escrito. Silveira recusa assinar, referindo que só assinaria um que trazia consigo no bolso. A reunião dá em nada.

Fernandes Tomás convoca de novo o Sinédrio e dá-lhe conta do impasse. O Coronel Sepúlveda é escolhido para reunir com Silveira e trazê-lo à razão. Este vem a assinar, no dia 22 de Agosto, um novo manifesto, desta vez da lavra de Ferreira Borges.

O Sinédrio dissolveu-se no dia 24, com o estalar do movimento e com a entrada de alguns dos seus membros para a Junta Provisional do Governo.

O PORTO E A BARRA DA FIGUEIRA DA FOZ



Um texto de 1947 onde se denota como, às vezes, a capacidade de fantasiar ultrapassa largamente a provável realidade das coisas.

* Em 1916, na festa de colocação da primeira pedra para o Casino do Estoril, o Almirante José Nunes da Mata, professor da Escola Naval, afirmou que o porto de abrigo principal do país, com características até de internacional, deveria ser o da Figueira.
Possível é, pois, que o porto da Figueira venha a ser procurado um dia pela navegação turística, compreendendo também a sua moderna modalidade, visto existir aqui espaço definido para a construção de um aeroporto no braço sul, margem direita, em terrenos que são hoje praia do rio e que tem por tôpo a ponte sul, recentemente construída.
Que mundo novo os progressos da aviação virão abrir num futuro não muito longínquo, sob este aspecto!
Sob o ponto de vista militar muito conviria que o porto da Figueira estivesse em condições de abrigar algumas unidades da nossa Marinha de Guerra, como, por exemplo, submarinos e canhoneiras necessárias para a defesa do país e a fiscalização da pesca.
Poderia até vir a ser um porto franco, devido à sua posição no centro da costa metropolitana, com admiráveis ligações ferroviárias e rodoviárias (…) Com o porto crescerão os negócios, aumentarão as horas de trabalho, multiplicar-se-ão as fontes de receita.
(…) Um importante movimento, relacionado com o tráfego, virá a manifestar-se e já se pode deduzir das estatísticas.
Está integrado nas redes ferroviárias da Beira Alta, da Companhia Portuguesa – hoje unificadas.
(...) Fica a umas escassas dezenas de metros do Mar, o que não acontece com alguns portos de outras cidades, que ficam a quilómetros, sendo evidente que é muito mais fácil manter dragado e fundo um pequeno canal nestas condições, do que um de grande extensão, podendo ainda afundar-se a barra, rompendo-se a rocha do fundo.
(…) Toda a região demarcada do Dão, terá no porto da Figueira, que a dará a conhecer ao mundo, a melhor saída para os seus reputados vinhos (…)
(…) As obras do porto são necessárias, para que a indústria do sal reconquiste a sua posição (…)
A Figueira atingirá então o seu apogeu, a sua potente expansão, e a praia, de tipo nobre e encantador, fará ainda mais a sua fortuna. É esta a grande coluna do seu alicerce, da sua actividade fecunda, que lhe dará âmbito para ter muitas ideias novas, mais liberdade no trabalho e prestígio para o Estado.

* In, Jardim, José, As grandes linhas de uma cidade, Figueira da Foz, 1947

22 de ago. de 2007

MAURÍCIO PINTO (1884-1958)



Maurício Pinto fez o curso comercial na Figueira da Foz e tornou-se empresário. Investigador, historiador, escritor, actor dramático, apaixonado do saber e das coisas da Figueira da Foz, Maurício Pinto foi uma figura marcante do seu tempo. “Pessoa de tendências marcadamente liberais e que mantém pelos seus patrícios mais ilustres um verdadeiro culto”, assim o definiu Salinas Calado.

Republicano convicto, foi vereador da Câmara Municipal logo após a instauração da República, funções que viria a repetir mais tarde. Maçon, da Loja Fernandes Tomás, foi também fundador do movimento Rotário na Figueira da Foz.

Apaixonado da Arte de Talma criou o Grupo Dramático Figueirense e o Grupo dos Simples tendo integrado o grupo cénico do Ginásio Figueirense. Experimentou, como actor, as tábuas do desaparecido Teatro Príncipe.

Foi Provedor da Misericórdia da Figueira e teve responsabilidades directivas na associação Comercial.

Colaborou muito com a imprensa e era amiúde convidado para ser palestrante sobre os mais diversos temas. Camiliano, coleccionava materiais respeitantes ao escritor romântico, tendo cedido o seu espólio para exposição nas comemorações do centenário de Camilo. Deixou várias obras, entre elas, talvez a mais conhecida, escrita em colaboração com Raimundo Esteves, “Aspectos da Figueira da Foz”. Homem de livros, doou à biblioteca Pedro Fernandes Tomás os seus papéis.

TORRES DE BUARCOS - ALMENARAS E FACHOS



* Segundo Viterbo e Pinho Leal, as almenaras eram fogueiras convencio­nadas, que ardiam de noite nos altos dos muros, das torres e em atalaias, isto é, em determinados locais elevados, destinadas, principalmente, a darem sinal de rebate pela aproximação do inimigo.
Eram os telégrafos doutros tempos.
Um dos pontos escolhidos para o fim referido era o marco geodésico, existente muito perto da capela da Senhora da Encarnação, construído sobre um cunhal do antigo Castelo, a que um documento de doação feito por D. Afonso III aos frades de Santa Cruz, existente no livro nº 2 dos Direitos Reais - Arquivo Nacional - citado por Goltz de Carvalho, chama «Torre de Buarcos».
Esta construção, que algumas vezes subimos pela sua estreita e íngreme escada de degraus, meio desmantelados, para apreciarmos o belo panorama que de cima se disfruta, tem doze metros de altura.
As almenaras deram o seu lugar aos fachos, por estes serem mais aperfeiçoados. Os fachos, que eram enormes archotes, prestaram óptimos serviços de farolagem, para aquela época, orientando a navegação nas costas e entrada nos portos.
Havia «Companhias do Facho», compostas de oficiais, sargentos e soldados, sendo notáveis os serviços desses corpos do exército na Guerra Peninsular.
Um auto da Câmara da Figueira refere-se a duas requisições desses fachos, feitas pelo alferes da 8ª Companhia de Ordenanças, António Maurício de Oliveira, da Figueira, e por outro oficial da mesma patente, Bento Gonçalves Amaro, de Redondos. .
A Câmara aprovou que lhes fornecessem: - duas barracas, dois mastros de batel, dois moitões com adriças, uma carrada de mato, uma bandeira, um lampião e o azeite preciso, sendo estes fornecimentos pagos pelo município.

* texto de Maurício Pinto, In Notícias da Figueira - 13-12-1941

21 de ago. de 2007

POETAS FIGUEIRENSES

Caía a tarde. A`noite desse dia
No meio duma orgia
Nero, vestindo a sirma e o coturno
E lendo uma ode sua, declamava:
- Ó venturosa Roma, outr`ora escrava
Ò geração de Eneias
Cujo sangue lateja em minhas veias!
Como te faz feliz o meu governo!
Por Júpiter eterno,
Eu fiz voltar a idade de Saturno.

Cardoso Martha, parte do poema “A Cordaz diante de Nero” , dedicado a Raul Brandão

O MAR DE FANÉ



* A franja das espumas lambia a areia grossa e pedregosa. Sucediam-se macias corcovas de água que iam rasoirando o verde glauco. E, para além, o mar – o mar sem fim, o mar que era o seu enlevo, a sua paixão, o senhor do seu querer e do seu sentir…
Que lindo estava o mar! Nem o céu – dum azul ferrete onde boiavam nuvens de algodão em rama – se lhe podia comparar.
Lisinho como um espelho!
Com que alvoroço se sentiu erguido, passado de braços em braços até se sentar no pináculo da proa, junto à cruz das bordas.
Mal passou as portas, Buarcos rasgou-se-lhe na enseada. O casario branco rebrilhava. Fulgiam vidraças onde a luz acendia em labaredas. A capela da Senhora da Encarnação, no topo, rutilava, benzida do primeiro oiro do sol. Depois, a lomba da serra verdejava de pinheiros que iam escalando os morros até à Bandeira.
Içaram a vela. Ao cambar, o cordame rangeu, o barco empinou-se, tombou ao carrego do pano inflado e a quilha entrou a varar a água deixando uma esteira luzidia.
João tinha as pupilas estáticas num deslumbramento!
Já a ponta do Cabo Mondego – unha negra da terra – se sumira no horizonte. Agora só a concha do céu, um penacho de fumo dalgum vapor que o assava muito longe – e o Mar!
(*) De João Fané, banquista, de Raimundo Esteves, Latina ed, 1942

19 de ago. de 2007

O CAMINHO-DE-FERRO



A 3 de Agosto de 1882, D. Luis I, acompanhado da rainha, D. Maria Pia de Saboia e de vários ministros do seu governo, veio à Figueira da Foz inaugurar o troço que ligaria a cidade à linha do caminho-de-ferro da Beira Alta. A primeira pedra dos trabalhos tinha sido lançada em 10 de Agosto de 1880. Coube à Figueirense, à Dez de Agosto e à banda do Paião abrilhantar a cerimónia, tendo actuado igualmente a Banda da Infantaria 18 e a Banda Conimbricense.
As autoridades foram recebidas na Assembleia Figueirense e fez-se a bênção das locomotivas e um “Te Deum” na igreja matriz. O almoço foi oferecido pelo Município, presidido então por Francisco Lopes Guimarães e teve lugar na Casa do Paço.

O processo iniciara-se em 1874, através de uma solicitação feita pela Associação Comercial à Câmara dos Deputados pedindo a ligação da Figueira à linha férrea nacional. Em Julho de 1878 foi aberto concurso tendo aparecido uma firma concorrente, a Societé Financière de Paris que, para além da construção ficaria a explorar a linha por 99 anos.
Em Janeiro de 1879 constituiu-se a Companhia dos Caminhos-de-ferro da Beira Alta, tendo os franceses cessionado a esta os direitos que lhe tinham sido outorgados.

A linha passou a trazer até à Figueira produtos de exportação, como o vinho, as aguardentes e a madeira, bem como outros para consumo local, como a batata, a castanha, o azeite e cereais. Da Figueira para o exterior saía, entre outras mercadorias, sal, cal, carvão, peixe seco e fresco e vinho. O movimento de passageiros era escasso – metade do da linha do Oeste (*). A ligação teve uma importância crucial no desenvolvimento do turismo figueirense.

Grande empenho em todo o processo teve Saraiva de Carvalho, Ministro das Obras Públicas, governante que obteve da comunidade figueirense o reconhecimento pela sua dedicação.

(*) A linha do Oeste chegou em Julho de 1888 e em 1889 fez-se a abertura do ramal entre a Amieira e Alfarelos.

17 de ago. de 2007

UM MENINOZINHO VINHA VINDO...


*Um meninozinho, João Balãozinho, vinha vindo em seus passos travessos, de cumprir um recado na loja, satisfeito, con­sistido de trazer em cada sua mão, engarrafado, um litro de vinho. Que era mister, em assinadas ocasiões, ter de ir-se por essa malvasia, a comprá-la, tão sempre desexistida foi ela das terras gandaresas, que não a produzem, sáfaras de areia e vento, leiras magras de chorume para imprir-se um plantio de bacelo. Há que, portanto, na devida maré, e quando é o caso, prover ao devido em afazeres diversos como: ser o dia de cozer­-se a broa, ou trazer gente de fora numa tardada, ou vir um alguém de visita, inesperado ou não, e ter de beber-se uma pinga. Que é, neste caso derradeiro, o que mandam as regras e usos de bem receber. Ah!, e a Gândara é hospitaleira.
Lá vinha vindo, pois, esse meninozinho com as duas garrafas bem aviadas, porque a mãe, no azo, já trazia o lume ao forno. O que, era, portanto. E havia de chegar um tal Maiorqueiro, ao cerrante da noite, fechar o negócio do boi de cobrição, que ficou de remissa da feira de Gatões. Eram dois os motivos por que, então e portanto. João Balãozinho vinha transportando essas duas garrafas, pejadas que nem, em cada sua mão, equilibrado no peso do corpo. Vem por carreiras e travessias de pinhais, o chão descarnado, e em cujos e quais pode muito bem dar-se uma topada. Porque há sempre uma raiz imprevista e treda, celerada, ou uma cova-falsa igualou tão mais.
(…)
Pois lá vinha vindo, cumpridor, esse meninozinho João Balãozinho; lá vem ele em suas alegrias ladinas, mas ainda no seu prazo, miúdos passos, ou conforme, porque há o parar e olhar, voou o garrancho do seu poiso, ou gaguejou a pega tagarela. E há que seguir o rumo e arte do peneireiro, ou escutar, atentivo, a trombeta do moquenco pontual, algures, rosnento e grosso, que é para distinguir: se é o burro do moleiro Zé Maluco, ou o das Quintaloas, ou a burra nova da tremoceira Maria Umbelina. Que vos parece?
(…)
João Balãozinho, que num ponto da sua viagem havia de cruzar-se com Manuel da, Fanata, o dos burros, o qual vai prendê-los nalguma resteva, ou num vaIado de sil­vas, ou num combro inventado para relvar-se. E era um casal, os cujos que iam levados à corda, o burro e a burra, que o meninozinho bem viu os escritos lá deles. Pois ficou-se parado a olhá-los, que lá iam indo, indo-se, subalternos e tão submis­sos, campassados. Aonde é que sítio ia o Fanata prendê-los?
Esse era um menino muito interrogativo, João (…)
(…)
Porém, quando. Estão a burra e o burro em seus cios transparecidos, tão assim, e nem as cordas não foi preciso esticá-las até finalmente; e já se davam em cheiraduras e mimos de beiços, espirravam estrondos, aluadões, a mostra­rem os dentes todos que tinham. Espoldrinhavam a sua ale­gria, amorudos, desencabrestados, a resteva era o seu paraí­so. Quem passasse havia de apreciar, quem é que não?, estes trafegos. E sobretudo, ah!, e sobretudo. Porque o burro tinha uma grande maçaneta a nascer-lhe na pele da barriga, ou era um unteiro, que crescia, e crescia;
(…)
E ouve-se o carro do Toino Quintaneiro, de regres­so a casa, gemendo a falta dum untozinho nas garridas de cada coicão. O que é mais um sinal, outro, de estar a luz por um triz, com um pé no dia e o outro já dentro da noite.
Foi quando no interim e átomo do tempo, irremediável. Foi quando. O burro atirou as ambas patas para cima de quem estava a pedi-las, jogadas à bruta, escarranchado ao pino, gi­gante. Momento penetrante, oh! O chão estremeceu por todo ele, abalado inteiro, e a burra atreveu-se com todo o peso e poder do seu semelhante. A quanta brutidade e fragor!
E nunca não soube-se onde o meninozinho estava com os pés: se assentados no firme, estando espasmecido no meio do carreiro; ou se ele estava embarcado nalguma nuvem, transplantado, por outros mundos remotos. João Balãozinho estava com as mãos caídas dos braços, assombrado, e das cujas e quais, intactas e cheias, pendiam as garrafas de vi­nho. Tivesse-as ele posto no chão, ao alto, que ficavam res­guardadas dos mil perigos à vista. Mas (…)
No meio do caminho, hem! Tinha uma pedra e topada, estardalhaço, o vinho e vidro em mil pedacinhos.
* Idalécio Cação, Os pés e as mãos, ret. de O Chão e a Voz, ed. Escritor, 1998

16 de ago. de 2007

UM SECRETO ENTARDECER



A Figueira dos meus tempos ainda é a do carro americano, esse brinquedo inefável tirado a um par de mulas e que desenhava um jubiloso percurso desde o largo fronteiro à estação (havia um túnel junto ao Ténis Clube) até um pouco para além de Buarcos.
Casinos eram vários: o Europa, hoje parece que pensão, onde todas as noites se exibia um excelente quarteto de que era pianista o compositor Ruy Coelho; o Espanhol, na actualidade Café Nicola, com atracções de vário tipo; o Oceano, animado pelo conjunto do hábil pianista figueirense de apelido Mesquita, mais conhecido por Mesquitinha, pai de 6 ou 7 filhos e de temperamento bastante remexido e ambíguo; por fim, o Grande Casino Peninsular, que atingiu por essa época os momentos sem dúvida mais prestigiosos de toda a sua história.
Dirigido por Ernesto Tomé e Arménio Faria, figuras ímpares de largo espírito criativo, lúdico e bem-humorado, ali se efectuavam as sete voltas ao casino (réplica juvenil de certos feitos do ciclismo local); e essas admiráveis festivas garraiadas infantis, com garraios autênticos, e os rapazinhos vestidos a carácter (lembra-se, Dr. Joaquim de Sousa?), enfiados em nervosos cavalos de pasta, prontos, os corcéis, a entrarem ao som de um paso doble nobremente na arena.
Pelo menos uma vez por semana havia música de concerto pela orquestra de Salão regida pelo notável violinista René Bohet. E música militar no coreto do Jardim. Onde, santo Deus, tudo isto já vai.
A Figueira desse tempo era uma cidade culta. Exigente, cosmopolita e viva, cidade aberta e atractiva, muito procurada por espanhóis da raia e da meseta. Muitos outros estrangeiros vinham para a então “Rainha das Praias” em busca de sol, iodo, mar e diversões.
Personalidades como Vitorino Nemésio, de quem tive a honra de ser amigo, ali passavam com a família a época balnear, frequentando o então querido Professor a Farmácia Gaspar, na rua da Liberdade, onde volta e meia se reunia com Joaquim de Carvalho, João de Barros, Mesquita de Figueiredo, Gaspar Simões e outras imperecíveis figuras tutelares.
Impossível esquecer as garraiadas de beneficência, com o David Viana, o Boa Nova, o “Charlot” e outros mais, todos de branco (…)
Sim, esta era a minha cidade, a minha rara cidade de outrora, pequeno burgo de ruas de vento e palmeiras, lugres, caiaques, gaivotas, cais solitários e marés vivas.

Luís Cajão, Um Secreto Entardecer, ed. Escritor, Lisb. 1998

15 de ago. de 2007

JOSÉ BENTO PESSOA (1874-1954)



* José Bento era o ídolo dos figueirenses. Tinha já batido o record mundial e derrotara grandes campeões. Os seus patrícios não toleraram a vitória de Dionísio (1). Os jornais da época insurgem-se contra os exaltados que não souberam conter-se.
Pode dizer-se que o ciclismo ginasista de então nasceu, viveu e morreu com a actividade de José Bento (2). A carreira do figueirense é uma página única do desporto nacional.
De 1892 a 1905, com um interregno de 1902 a 1905 correu em Espanha, França (Paris) Bélgica (Gand), Suiça (Genebra), Itália (Turim) Alemanha (Berlim) e Brasil (Pará). Em Espanha disputou provas em Vigo, Corunha, Sevilha, Bilbau, Salamanca, Ávila e Madrid. Na capital de Espanha esteve continuamente oito meses e, em Paris, dois anos. Em Maio de 1897, na inauguração do velódromo de Chamartin, Madrid, ganhou a prova internacional e bateu o record mundial dos 500 metros, que pertencia a Jacquelin, baixando o tempo de 34,6 para 33,2 segundos.
(…) Conquistou grande número de medalhas e objectos de arte, e entre os prémios pecuniários que obteve conta-se o que ganhou no Pará – 10 contos fortes.
(…) Quando as notícias das vitórias chegavam à sua terra, o entusiasmo dos figueirenses expandia-se em manifestações ruidosas e festivas: saíam as filarmónicas, a fachada do Teatro Príncipe iluminava, havia marchas, au flambeaux – uma loucura. E quando o campeão vinha descansar – meia Figueira ia festejá-lo. Chegou a ir da estação do Caminho-de-ferro para casa aos ombros dos mais entusiastas. Isto aconteceu, por exemplo, quando, logo a seguir à derrota de José Bento, nas festas do S. João de 1901, ele regressou do Porto, onde vencera duas vezes José Dionísio no velódromo Maria Amélia.
(…) Em 1 de Setembro de 1901, os clubes ciclistas do país prestaram uma homenagem ao grande campeão. Para lhe ser entregue uma mensagem e um brinde, organizou-se a estafeta ciclista Lisboa-Figueira.
José Bento Pessoa foi não só um campeão mundial, o maior ciclista de velocidade do seu tempo, mas também um treinador competente.


* In, Cardoso, J. Sousa, Ginásio Clube Figueirense, subsídios para a sua história (1895-1944), Figueira da Foz, 1944

(1) José Maria Dionísio, de Viseu, bateu José Bento Pessoa na grande corrida de S. João de 1901, no improvisado velódromo da então rua do Príncipe Real (da República) e Fernandes Tomás.
(2) Outros ciclistas da altura, companheiros de José Bento, eram: José de Araújo Coutinho, Albano Custódio, Constantino Pessoa, Manuel Simões Barreto, Adolfo Rodrigues, António Pestana, José Novaes, António Reis, Afonso Rainha, Rodrigues de Oliveira, António Mesquita, Joaquim Alves Fernandes Águas.

14 de ago. de 2007

POETAS FIGUEIRENSES

Começo de Confidência

Sentemo-nos aqui, n`este sombrio
Recanto onde a silveira vive presa.
Em trez léguas d`aqui em redondeza
Vemos os campos…os casais…o rio…

Tu, que andaste de mim tão erradio
Porque, segundo a voz da aldeia reza,
Tinhas queda também p`rá camponesa
Que a cabeça me poz em desvario;

Tu vaes agora ouvir, porque decerto,
Se tens amado, entenderás melhor
Toda a história das penas que padeço.

Ouve-me bem; e diz do teu acerto
O que é que pensas: - Uma vez Leonor…
- S`tas attento a ouvir-me? – Então começo…
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1904 Sant`Iago Prezado

PETRÓLEO FIGUEIRENSE

Narra Manuel Gaspar de Barros nas suas Memórias (1) que em 1917 “quando se abriu um poço de água na Rua das Lamas (…) no palácio que fora do Conde de Verride, o Dr. João Santiago Prezado, poeta e diplomata, apareceu petróleo a sobrenadar na água”.
Refere que Prezado encomendou dois estudos a um professor do Técnico de seu nome Fleury, o qual investigou as regiões do Mondego inferior e a região situada “entre os paralelos de Cantanhede e Alcobaça”.
O Prof. Fleury recomendava sondagens a fazer em Verride e nos Vais, as quais não tiveram depois andamento.
Mais tarde, já nos anos 40, a Companhia de Petróleos de Portugal (capital do Estado português e de um empresário nórdico) – ainda segundo Manuel Gaspar de Barros – fez sondagens em Verride e ali, a poucos mais de mil metros, “apareceu algum petróleo”, mas a CPP tinha poucos meios e as sondagens foram pouco profundas.

Fleury também assinalou petróleo no Cabo Mondego e neste local “os belgas da sociedade Foraki (…) parece que o encontraram nas sondagens que fizeram na procura do carvão”.
Manuel Gaspar de Barros refere ainda que o Conde de Castellane, judeu exilado na Figueira aquando do grande conflito europeu, lhe terá assinalado o seu feeling de que haveria petróleo no Cabo Mondego. O conde era um “experimentado pioneiro do Cáucaso”.
Já nos anos 70 voltaram a fazer-se sondagens. O ouro negro foi encontrado mas não em quantidade que justificasse a sua exploração comercial.

(1) Manuel Gaspar de Barros, filho de Manuel Gaspar de Lemos, in Memórias, Ed. do autor, 1982

A ÁGUA



Em 22 de Agosto de 1889 a água correu pela primeira vez nas canalizações das casas da Figueira da Foz. Três anos antes a Câmara tinha adjudicado a concessão do abastecimento de água e gás à firma inglesa Kirkham e Hersey (V. n/ post Dezembro, 2004, sobre a iluminação a gás) a qual cedeu direitos à Anglo-Portuguese Gás and Water Cª.
Sabe-se que António Santos Rocha, aquando do seu primeiro mandato como presidente da Câmara (1878-1880) fez contactos no sentido de se estudar o abastecimento de água à cidade e que um seu antecessor, João José Costa, em 1864, chegou a colocar a hipótese de aproveitar os caudais da vertente sul da Serra da Boa Viagem; certo é, também, que já nos finais do século XVIII a resolução do problema tinha sido tentada.
Em Agosto de 1889, a água, captada em Tavarede (Prazo), corria em mais de 400 casas figueirenses. Rezam as crónicas que não era de grande qualidade.
A população mais pobre não a podia pagar e continuava a valer-se das fontes disponíveis: da do Largo da Fonte e da Várzea (não sabemos se se mantinham activas as da Bica e a de Stº António), embora estas estivessem também inquinadas.
Em trabalhos efectuados nos finais dos anos 80 (há 20 anos), técnicos do Museu Municipal estudaram duas antigas galerias de abastecimento de água (1) (de finais do séc. XVIII), uma com nascente na mata de Stº António e outra numa mina no Casal da Rata, a qual descia a rua dos Combatentes, possivelmente até próximo da praia da Reboleira, servindo o abastecimento de navios.

(1) V. Revista Litorais, nº 2, Maio de 2005, Os primórdios de abastecimento de água à Figueira, um artigo de Isabel Pereira

5 de ago. de 2007

A MULHER QUE...



* Tinham ido à Serra da Boa Viagem. Era uma tarde de calor. A bola do sol parecia uma brasa redonda. Estava tudo azul e oiro. O céu. Os longes do mar. O rio quieto. Na fornalha do sol candente, os corpos, as almas, as coisas ardiam. O automóvel galgava as lombas da serra. E a vida crepitava em labaredas. E dessa vez duvidou…
No topo da serra, o panorama surpreendente, fez esquecer tudo o restante. É certo que a bola do sol boiava no azul sem vinco, derramando calor. E que ao Redol, pelos montes que se esfumavam nas distancias, pelo vasto mar sem fim, pela fita de nastro do rio que serpeava entre margens dum verde moço, pelos areaes do sul que flamejavam, - era tudo azul e oiro. Mas o panorama deslumbrava as retinas. E o resto esqueceu…
Saíram do carro. Da eminência, era um assombro de belesa que se rasgava. Desceram à mata dos cedros. Era tudo quiétude e silencio. Nem viv`alm! As franças do arvoredo, baloiçavam-se com tanta doçura, que o rumo era tão brando como uma carícia. Florice, enlaçou Luisinha. No ar palpitavam azas de seda, seivas perturbantes. As mãos de Florice, subiram o busto da amiga…
- Que lindo… que lindo…
Um dos seios de Luisinha, estava na concha das suas mãos:
- Que lindo… que lindo…
Mas Luisinha desprendeu-se. Correu. E dessa vez duvidou…
* Da novela "A mulher que não gostava de homens", de RAYM. (pseudónimo de Raymundo Esteves) editado em 1936

O DESEMBARQUE


* De 1 a 3 de Agosto de 1808 (passam 200 anos daqui a um ano) desembarcaram na praia do Cabedelo (1) dez mil soldados do corpo expedicionário inglês, comandadas pelo célebre Wellington. No dia 8, juntaram-se a estes mais cinco mil homens sob o comando do general Spencer.
O desembarque foi complicado devido ao estado do mar, apesar do auxílio prestado pelos figueirenses e pela galeota dinamarquesa “Elisabeth”.
Wellington ficou hospedado na casa do pároco António de Macedo, em Lavos, onde montou o seu quartel general e onde lhe foi dada a comer - por mor da fraqueza que trazia - uma canja rica, que ficou celebrizada numa carta do general a um amigo.
Em 1932 foi colocada na dita casa a placa da imagem.
* Veja-se o arquivo de Julho de 2004 onde se insere uma carta de um soldado inglês do corpo de Wellington escrita a 8 de Agosto de 1808 a partir do acampamento de Lavos, próximo da Figueira.
(1) M. Pinto e R. Esteves referem que o desembarque ocorreu dentro do porto da Figueira.

4 de ago. de 2007

FOLCLORE PORNOGRÁFICO


É lançado hoje, na Havaneza, um fac-simile do "Folclore Pornográfico da Figueira da Foz", uma obra editada em 1914, sem identificação de editor ou tipografia.

Trata-se um conjunto de quadras, adivinhas, imprecações, superstições, costumes, adágios, contos e modismo do bom povo figueirense. O conteúdo, popular e brejeiro, de cariz desveladamente erótico, revela acima de tudo a linguagem que as gentes utilizavam para traduzir aquilo que constituía conteúdo proibido nos meios sociais castos e púdicos.

Julga-se que este "Folclore" constituiu recolha de Cardoso Marta e Augusto Pinto, pois os mesmos editaram em 1911 e 1913 um "Folclore da Figueira da Foz" em dois tomos, obras que seguem a mesma sistematização que a sua congénere "pornográfica", a qual parece ter sido amputada daquelas primeiras edições.

Aqui fica um pouco do verbo desse saboroso "Folclore" agora reeditado:


Menina da saia branca
com sua barra por baixo,
deixe ver o pintassilgo
pr`a meter o meu cartaxo.

O cartaxo quer casar,
a folosa anda saida,
e anda o pisquito de roda
p`ra lhe meter a torcida.

Vou-te rogar uma praga:
em casa te cáia um raio
que te cáia entre as pernas
e te rache o papagaio.