10 de jun. de 2008

O VELHO NAVIO


Vai para o Mar!
Pois só o Mar, que é traiçoeiro, é que não mente;
-Floresce em ilhas para o náufrago impaciente
E para o sonho que deseja repousar.
Simples miragem? O que importa se a miragem
Nos trouxe a febre de partir e de aportar,
A Primavera renascente da viagem!...
Deixa o passado junto ao cais, ó meu navio!
- Soluça lento o fado triste nas guitarras,
Há beijos quentes nas tabernas, sobre o rio…
Vai para o largo, para o Mar, quebra as amarras,
Não oiças mais o seu encanto doentio!
Mas, ao partir, para galgar com rapidez
A noite e o espaço,
Atira ao fundo com teu lastro de amargura, Com o teu lastro de agonia e de cansaço,- De vida morta, de vida impura –
E a proa em riste, entre gaivotas a cantar,
Vai para o Mar!

João de Barros( 1881-1960)