11 de set. de 2007

FIM DE ESTAÇÃO



*Passou-se o cabo ao vaporzito que punha, no ar delgado e macio, um penacho de fumo esgarçado. O molinete, a dar-que-dar, alou a gata. E o reboque começou a guiar o lugre para a barra.
A essa hora já a praia de banhos formigava de gentana. Era Outubro e ainda centenas de barracas se alinhavam, simétricas, pelo areal, como um acampamento bizarro de um grande exército mourisco – os topos abicados, reluzindo de brancuras. Nas esplanadas cimeiras, faiscavam grandes chapeirões, de lonas vistosas e garridas. Os galhardetes de cores berrantes, que demarcavam as companhias dos banheiros, desdobravam-se com graça. Uma avioneta amarela passeava pelo alto como uma libélula doirada. E a espuma das ondas que se desenrolavam lentas e mansas lembrava uma renda de prata a vestir a orla da saia de lhama de seda, que o mar punha à roda da Figueira.
(…) Corriam mulheres apressadas e lestas acompanhando a rota do barco. Garotada bravia pinchava, paredão fora (…).
O mercado com as marquesas de ferro, o jardim público – mancha de verdura reluzente – o Cais, as duas praças, de jeito pombalino, com seus monumentos, a avenida formosa e ribeirinha ladeada de árvores roliças, tudo foi catado, com acesa curiosidade, por suas pupilas irrequietas.
O lugre desceu até ao trapiche. Arreou o ferro. Despediu o reboque.

*In João Fané, banquista, de Raymundo Esteves, 1942