21 de ago. de 2007

O MAR DE FANÉ



* A franja das espumas lambia a areia grossa e pedregosa. Sucediam-se macias corcovas de água que iam rasoirando o verde glauco. E, para além, o mar – o mar sem fim, o mar que era o seu enlevo, a sua paixão, o senhor do seu querer e do seu sentir…
Que lindo estava o mar! Nem o céu – dum azul ferrete onde boiavam nuvens de algodão em rama – se lhe podia comparar.
Lisinho como um espelho!
Com que alvoroço se sentiu erguido, passado de braços em braços até se sentar no pináculo da proa, junto à cruz das bordas.
Mal passou as portas, Buarcos rasgou-se-lhe na enseada. O casario branco rebrilhava. Fulgiam vidraças onde a luz acendia em labaredas. A capela da Senhora da Encarnação, no topo, rutilava, benzida do primeiro oiro do sol. Depois, a lomba da serra verdejava de pinheiros que iam escalando os morros até à Bandeira.
Içaram a vela. Ao cambar, o cordame rangeu, o barco empinou-se, tombou ao carrego do pano inflado e a quilha entrou a varar a água deixando uma esteira luzidia.
João tinha as pupilas estáticas num deslumbramento!
Já a ponta do Cabo Mondego – unha negra da terra – se sumira no horizonte. Agora só a concha do céu, um penacho de fumo dalgum vapor que o assava muito longe – e o Mar!
(*) De João Fané, banquista, de Raimundo Esteves, Latina ed, 1942